____A teoria crítica das relações internacionais (RI) surge como oposição ao debate neo-realista/neo-liberal dos anos 1980. Sua contribuição gira em torno de uma crítica feroz a concepção realista das RI como sendo uma política de poder, além disso, questiona a pretensão científica e o positivismo empregado nas teorias de RI. Para os teóricos críticos, as teorias tradicionais apresentavam limitações na compreensão e análise das mudanças presentes na política mundial. Outro aspecto importante é que a teoria crítica procura incorporar elementos do marxismo como pontos de partida a suas explicações.
____Em seu artigo Social Forces, States and World Orders: Beyond International Relations Theory, Robert Cox propõe que "toda teoria é para algo e para alguém”, além de que, todas as teorias possuem uma perspectiva que é dada através de uma posição social e política em determinado tempo e espaço, neste sentido, todos os velhos conceitos de uma teoria devem ser ajustados, rejeitados ou substituídos por novos conceitos. Não há teoria sem caráter normativo, ao fazer suposições e eleger conceitos a teoria limita o escopo de análise, ou seja, ela vê somente por uma lente, o que impossibilita que ela seja neutra. Cox faz uma crítica contundente às teorias positivas, em especial ao realismo, o qual delimita que os Estados buscam poder e segurança em um sistema de Estado moldado pelos atores majoritários. Ao afirmar essas premissas os pesquisadores realistas induzem o comportamento do Estado e tornam-se teóricos normativos. Ao mesmo tempo, a teoria crítica também é normativa ao promover a emancipação humana.
____No que tange a meta-teoria proposta por Cox, podemos dizer que a mesma é entendida assim pelos seus aspectos ontológicos e epistemológicos sobre a produção do conhecimento. Neste sentido, o autor traz uma divisão de como as teorias se diferem conforme seus propósitos: (1) problem-solving theory, as quais se caracterizam por tomar o mundo como ele é, voltam-se para a fixação de padrões e parâmetros para um problema particular de uma determinada área de um sistema social; (2) critical theory, procura perguntar como tal ordem mundial veio a ser a presente em vez de aceita-la como dada, se direciona ao entendimento da complexidade social e política como um conjunto de fatores (as a whole).
____Já dimensão explicativa de Cox pode ser relatada ao tratar as estruturas históricas como um quadro de análises. O autor propõe que essa análise resulta em uma imagem particular da configuração das forças em um determinado período, a qual pode ser expressa por três categorias de forças, as quais agem reciprocamente: (1) ideias; (2) instituições; e (3) capacidade material. A relação entre estas três forças são determinantes para a ascensão de uma ordem alternativa. Esse estudo leva Cox a definir que a hegemonia não é reduzida somente a dimensão institucional, outros fatores legitimam a permanência de determinada pax.
____Voltando ao caráter normativo, Cox expõe que o neo-realismo induz os atores a adotarem e entenderem o sistema de estados através da racionalidade neo-realista (poder/segurança) como guia de ação, o que para Habermas, no artigo de Payne e Sambat Critical Theory, Habermas, and International Relations , o neo-realismo tem em fato nos ensinado o horror da irracionalidade, onde os “últimos restos de uma relação de confiança essencialista com a razão foram destruídas com os fatos” (guerras) observados no século XX. Assim como Cox, Habermas vê a necessidade de uma nova alternativa teórica das relações internacionais.
____Ao explicar a ascensão de novas estruturas históricas através da conexão entre instituições, capacidade material e ideias, é possível relatar a aproximação de Cox com o pensamento de Habermas no que tange as ideias. Para Cox, as ideias possuem dois significados: (1) consistem nos significados intersubjetivos ou noções compartilhadas da natureza da relação humana e que tende a perpetuar hábitos e expectativas de comportamento (diplomacia); (2) as ideias são as imagens coletivas asseguradas por diferentes grupos de pessoas (justiça). Neste sentido, Habermas relata que em seu projeto de democracia deliberativa se faz necessário à racionalidade comunicativa, e que a mesma só é alcançada com um acordo intersubjetivo. O acordo intersubjetivo tratado por Habermas só é realizado através de um consenso no campo das ideias, tanto nos significados, quando nas noções de imagem coletiva. Esse consenso é a base da legitimação das normas internacionais e de determinada estrutura, uma vez que exista um choque entre as ideias coletivas se levanta a possibilidade material e institucional de uma estrutura alternativa.
____A teoria crítica de relações internacionais representou um consistente contraponto ao positivismo das teorias dominantes nos anos 1980, e possibilitou que abordagens teóricas diferentes pudessem ter suas aspirações, ao menos, colocadas em debate. Cabe ressaltar as dimensões teóricas colocadas em debate por Cox, especialmente ao expor que toda teoria possui um caráter normativo, tirando o rotulo de neutralidade das teorias positivas. Podemos observar que o caráter intersubjetivo das ideias esta presente tanto em Cox quanto em Habermas, trazendo a importância de tal ponto para a legitimação de normas internacionais.
Referências:
COX, Robert. “Social Forces, States and World Orders: Beyond International Relations Theory”. Millennium, vol. 10, no. 2, 1981, pp. 126-155.
PAYNE, Rodger e SAMBAT, Nayef. “Critical theory, Habermas and International Relations”, in: Democratizing Global Politics, NY: Suny Press, 2004, pp. 1-17.
PRICE, Richard. Critical Theory. The Oxford handbook of international Relations. 2008.
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