____A teoria crítica normativa é uma tentativa de contrapor as teorias do mainstream, para isso abordam as mudanças do contexto internacional, tais como os efeitos da globalização na soberania do Estado e a reação por parte da sociedade civil a estes acontecimentos, procuram também debater sobre cidadania, proteção contra “danos” (harm power), direitos individuais, ética e moral nas relações internacionais, emancipação, etc. A agenda da teoria crítica normativa representa o interesse pela mudança e as possibilidades em que esta pode ser realizada – de preferencia para um mundo mais justo, como vamos ver a seguir.
____Em seu artigo the transformation of political community towards ‘a cosmopolitan system of general political security’, Linklater procura debater sobre o ideal kantiano de um sistema cosmopolita de políticas gerais de segurança, o qual busca proteger não apenas os Estados, mas também os indivíduos e suas varias associações. Neste sentido, Linklater coloca em análise se a ideia do desenvolvimento dos direitos do cidadão é antagônica a noção clássica de Estado-nação.
____Segundo Linklater, a capacidade do Estado em fazer as ligações necessárias entre cidadania e nacionalidade está diminuindo, sendo que as forças que proporcionam esse “rompimento” são: globalização e fragmentação. Nessas condições, novas formas de comunidades políticas, e a própria cidadania tornam-se possíveis e desejáveis. Argumenta-se, portanto, que os cidadãos nacionais não podem limitar o acesso à comunidade política, os mesmos possuem deveres morais de incluir no diálogo os cidadãos de outros Estados em ações que possa afetar seus interesses vitais. Apesar de um projeto ambicioso, através destas ações aproximamo-nos (ou deveríamos) de uma democracia cosmopolita, reconhecendo que a distinção entre cidadão e estrangeiro é moralmente irrelevante nas condições atuais de interdependência.
____Para entender melhor a contexto internacional, Linklater procura na escola inglesa três formas de sociedade internacional: (1) pluralista; (2) solidarista; e (3) neo-medieval. O autor vê esses três tipos de sociedade internacional como complementares na promoção da ideia de uma comunidade de comunicação universal, sendo que está comunidade representa o quadro necessário para que haja progresso na ideia kantiana de um sistema cosmopolita de segurança política geral. Outra aproximação de Linkater com a escola inglesa pode ser vista no artigo The problem of harm in world politics. Ao tratar de ordem internacional e sistema de Estados, o autor busca nos comentários de Martin Wight e Hedley Bull as orientações cosmopolitas centrais para sua análise sociológica, também é notável a influencia da EI quando o autor explora a intercessão entre a tradição Grotiana e Kantiana. Podemos resumir a ligação de Linklater com a escola inglesa em: (1) pluralismo metodológico; (2) abordagem histórica e sociológica; (3) utilização do conceito de sociedade internacional; (4) Ordem internacional como pré-condição ao desenvolvimento da justiça.
____Voltando para as tensões entre os indivíduos e o sistema de Estados soberanos, outro autor a abordar esta temática é Frost. Em seu artigo Migrants, civil society and Sovereign States, Frost reconhece que todos nos vivemos em um mundo de Estados soberanos, e que isso indica um comprometimento normativo de nossa parte. Os Estados são responsáveis por promover a cada pessoa proteção, identidade valida, participação política, e instituições que promovam serviços sociais. Também é dever do Estado fazer com que os direitos básicos sejam cumpridos (como vimos com Linklater, o Estado detém o monopólio do poder judiciário), porém Frost nos pergunta: e aqueles indivíduos que vivem fora de um Estado, não possuem direitos? Este é o problema da perspectiva contratual, uma vez que a mesma falha em reconhecer o direito dos de fora (outsiders) através da soberania proclamada dos de dentro (insiders). Neste sentido, o autor aborda uma dicotomia presente entre nosso comprometimento com os direitos humanos e nosso comprometimento com o Estado soberano democrático. Se o mundo é dominado pela linguagem dos direitos humanos, como podemos conciliar estes direitos com a soberania? Para Frost, parte desta resposta pode ser concebida com a criação de uma sociedade civil global, no exemplo utilizado pelo autor, o mútuo reconhecimento dos direitos básicos por parte dos indivíduos proporciona a ligação que irá diminuir a tensão entre soberania e migração.
____Podemos observar que Frost procura desenvolver seus conceitos sobre uma preocupação ética, especialmente sobre a necessidade de não vermos os outsiders como meros objetos, se faz valer para isso o reconhecimento mútuo de direitos básicos de primeira geração e a criação de uma sociedade civil. Linklater, da mesma maneira, expressa os deveres morais cabíveis aos cidadãos, sendo um destes a flexibilidade do diálogo e do consenso, principalmente aos assuntos que interessem aos afetados, mesmo que estes não estejam inseridos na soberania do Estado. Neste sentido, as novas formas de comunidade política e a comunidade comunicativa universal de Linklater são eticamente desejáveis, no mesmo âmbito que é a sociedade civil tratada por Frost.
____Algumas divergências também podem ser elencadas. Para Frost, o Estado tem sua importância na legitimação dos direitos básicos proclamados pela sociedade civil global, o Estado é complementar a esta sociedade civil e deveria agir levando em conta os direitos humanos. Já para Linklater, com a criação de novas formas de comunidades políticas seria possível superar o Estado soberano, não haveria a necessidade de prerrogativas para exercer a cidadania perante o Estado. É importante ressaltar que ambos os autores argumentam que a cidadania e os direitos devem superar a conexão soberania/individuo para se tornarem mais efetivos.
Referências:
FROST, Mervyn. “Migrants, civil society and Sovereign States: Investigating on Ethical Hierarchy”, Political Studies, vol. 5, no. 46, pp. 871-885
LINKLATER, A. The Transformation of Political Community Towards ‘A cosmopolitan System of General Political Security’. YCISS Occasional Paper Number 55 March 1999
LINKLATER , A. “The problem of harm in world politics”, International Affairs, 78, 2, 2002, pp. 319-338.
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